Algarve tem Centro de Referência do Cancro do Reto que é esperança para os doentes

23 Agosto, 2021 | noticias

«Termos um centro de referência no CHUA é termos uma garantia de que os doentes algarvios são tratados com os melhores padrões, as melhores técnicas e a melhor qualidade, que está ao nível de qualquer centro que trata este tipo de patologia na Europa»

“Núcleo duro” do Centro de Referência: José Brás, Edgar Amorim e Paulo Caldeira – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

O Centro Hospitalar Universitário do Algarve (CHUA) tem o único centro de referência reconhecido pelo Ministério da Saúde no Algarve e Baixo Alentejo. Trata-se do Centro de Referência do Cancro do Reto.

A sul do Tejo, só existem mais dois Centros de Referência, de outras patologias, um no hospital Garcia de Orta, em Almada, e outro no Hospital do Espírito Santo, em Évora.

Este Centro algarvio, que foi criado em 2016 e terminou o seu processo de certificação e acreditação pela Direção Geral de Saúde em 2018, está a tratar atualmente cerca de 400 doentes de toda a região algarvia. O médico Edgar Amorim, especialista em Cirurgia Geral e coordenador do Centro de Referência, disse ao Sul Informação que a média de novos doentes a chegar, por ano, é de uma centena. Mas como o seu tratamento demora, em média, cinco anos, neste momento há já cerca de quatro centenas a ser acompanhados.

Mas o que é e para que serve um Centro de Referência? Edgar Amorim explica que «a criação dos centros de referência foi uma aposta do Ministério da Saúde em 2015. Basicamente, o que eles fizerem foi pegar em determinadas patologias que, pela sua especificidade ou pela sua necessidade de recursos, tivessem de ser concentradas em determinadas equipas, como forma de atingir os melhores resultados, quer clínicos, quer económicos».

Foram então «criadas as condições de modo a que estas patologias possam ser concentradas em equipas altamente diferenciadas e treinadas para conseguir bons resultados».

Aquele responsável acrescenta que «o Centro de Referência do Cancro do Reto do CHUA é formado por uma equipa multiprofissional, envolvendo médicos, enfermeiros, nutricionista, terapeutas e gestores, tendo também uma forte componente multidisciplinar. Estão envolvidos clínicos de diferentes especialidades, nomeadamente da anatomia patológica, cirurgia geral, gastrenterologia, oncologia médica, radiologia e radioncologia, que asseguram em conjunto o tratamento dos doentes, tendo como base elevados padrões técnicos».

«Termos um centro de referência no CHUA é termos uma garantia de que os doentes algarvios são tratados com os melhores padrões, as melhores técnicas e a melhor qualidade, que está ao nível de qualquer centro que trata este tipo de patologia na Europa», assegura aquele responsável.

Mais valia acrescida é o facto de, por existir no seio do CHUA, este Centro de Referência estar ligado à Universidade do Algarve. «Um dos nossos objetivos é a investigação e a investigação no Algarve. O nosso centro de referência tem todas as condições para desenvolver processos de investigação, até por estar associado de forma direta à academia», explica Edgar Amorim.

Equipa do Centro de Referência mais completa – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

Na região algarvia, a prevalência de cancro do reto entre a população é semelhante à do resto do país, sendo de 67 anos a média de idades de pessoas com esta patologia. Se este não é um problema mais grave na região que no resto do país, porquê criar aqui este Centro de Referência?

Paulo Caldeira, diretor do serviço de Gastroenterologia do CHUA e também membro da equipa de coordenação do Centro de Referência, explica que se tratou de um «processo de candidatura», tendo em conta «o know-how, a experiência, as pessoas e as tecnologias» que já existiam nos dois principais hospitais algarvios, os de Faro e de Portimão. No fundo, a criação destes centros de referência obrigou «os serviços, os hospitais, a prestar cuidados mais diferenciados e de maior excelência, em algumas patologias mais raras, de mais difícil ou complexo tratamento».

Tanto estes dois médicos como o enfermeiro José Brás, que integra igualmente o núcleo duro da equipa de coordenação do Centro de Referência, salientam que, neste cancro, como em todos os outros, é importante que os doentes sejam diagnosticados o mais cedo possível. Com a diferença que, no cancro do reto, se o diagnóstico for feito numa fase inicial, há agora 80 a 90% de probabilidades de sobrevida ao fim de cinco anos, ou seja, em termos mais simples, de sobrevivência.

Por isso, insistem, é tão importante o rastreio. Esta é uma tarefa que até não faz parte do trabalho do Centro de Referência, uma vez que, nos últimos anos, foram as Administrações Regionais de Saúde que passaram a promover rastreios regulares do cancro do reto. E tanto nessas campanhas regulares, como em consultas fortuitas com o médico de família, são apanhados muitos doentes em fases iniciais da doença, ou seja, em fase mais tratável.

Só que a pandemia veio alterar este estado de coisas. «Este último ano foi um pouco atípico, porque houve uma redução de cerca de 25% dos doentes que nos chegam», lamenta Edgar Amorim. Além disso, «os doentes estão a chegar-nos em estadios muito mais avançados».

É por isso que, numa iniciativa que o Sul Informação tem estado a apoiar, o Centro de Referência começou a promover a necessidade de as pessoas fazerem rastreio, publicando, no nosso jornal, artigos de vários especialistas a desmistificar e a esclarecer.

As pessoas que têm já sintomas, como sangue nas fezes ou alterações do trânsito intestinal, devem fazer, o mais rapidamente, o rastreio. «Hoje em dia, o ideal era conseguirmos diagnosticar estas lesões numa fase em que ainda praticamente não deram sintomas. E há formas simples de o fazer, através da pesquisa de sangue oculto nas fezes e depois, se necessário, fazendo uma colonoscopia, em que se podem detetar pólipos ou cancros muito iniciais», acrescenta Paulo Caldeira.

«Num mundo ideal, a partir dos 50 anos toda a gente deveria fazer uma forma de rastreio, de modo a detetar o mais precocemente possível as lesões, porque o tratamento, ou seja, as nossas possibilidades de tratamento e a probabilidade de êxito são hoje completamente diferentes», diz ainda o diretor da Gastroenterologia do CHUA.

Mas muitos dos casos são detetados através daquilo a que se chama «rastreio oportunista», quando «as pessoas vão ao médico de família e este se lembra de lhes dizer para fazerem um teste de sangue oculto nas fezes e, se for positivo, fazer uma colonoscopia».

«O problema é que nem todas as pessoas são abrangidas pelo rastreio, porque não há um sistema de convocatória», sublinha Paulo Caldeira. O sistema de convocatória, semelhante ao rastreio do cancro da mama, recorda, arrancou há pouco mais de dois anos, mas a pandemia fez o processo parar e até regredir. É aí que está a explicação para a quebra de um quarto dos novos doentes com cancro do reto a chegar ao Centro de Referência do CHUA: menos diagnósticos e mais dificuldade em aceder ao SNS resultam em menos doentes detetados.

Cirurgia em curso – Foto: DR

Uma das grandes resistências das pessoas a fazer o rastreio deste tipo de cancro é o medo da colonoscopia. O enfermeiro José Brás admite que «ainda existe um mito à volta da colonoscopia».

«Antigamente fazia-se com aparelhos piores, com pessoas menos experientes, e os exames, às vezes, podiam ser uma experiência um bocadinho dolorosa e desagradável», admite. Mas «hoje já não é assim: os aparelhos são muito melhores, mais fáceis de manusear, temos muitos mais técnicos e mais experientes e, sobretudo, temos, em grande parte das situações, o apoio do anestesista. O exame é indolor, não custa muito. As preparações que se têm de fazer já são mais bem toleradas», garante.

Voltando à questão dos rastreios. Quando estes eram mais sistemáticos, os doentes eram apanhados «numa fase mais precoce».

Mas isso alterou-se, com os constrangimentos trazidos pela pandemia. Quais são as consequências disso? «Em termos de sobrevida dos doentes, será expectável que estes doentes sobrevivam menos, haja uma diminuição da sobrevida ou da capacidade de eles estarem vivos passados 5 anos», admite Edgar Amorim.

«Estes doentes vão ter que ser submetidos a tratamentos muito mais agressivos, podendo envolver quimioterapia, cirurgia de receção hepática, portanto procedimentos muito mais agressivos e invasivos», explica. E, mesmo numa perspetiva economicista, «estamos a falar de custos muito mais elevados para garantir o tratamento destes doentes que nos chegam em estadios mais adiantados. Vamos ter que usar mais meios humanos, de diagnóstico, terapêuticos, mais meios com um custo maior, porque não se conseguiu fazer a parte da prevenção da doença», lamenta o coordenador do Centro de Referência.

Mas nem Edgar Amorim, nem toda a equipa baixam os braços, antes pelo contrário. «É importante ter a noção de que o tratamento das doenças oncológicas, e em especial do cancro do reto, evoluiu muito nos últimos anos. Há cerca de 40 anos, a taxa de sobrevida era de 30 a 40%. E neste momento temos taxas de sobrevida de 80 a 90%».

Portanto, o que é que as pessoas devem esperar do Centro de Referência? O coordenador garante que aqui os doentes (e as suas famílias ou rede de apoio) serão «avaliados e orientados por equipas multidisciplinares, que vão fazer o diagnóstico e o estadiamento correto destas lesões».

Enfermeira Isabel Botelho a acolher um doente – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

A primeira receção ao doente, quer na unidade hospitalar de Faro, quer na de Portimão, é feita pela equipa de enfermagem que integra o Centro de Referência.

Na capital algarvia, a enfermeira Isabel Botelho explica o que é feito: «somos nós que apanhamos o doente assim que ele chega. Damos as notícias boas ou más e acompanhamos a partir daqui, até ao final do processo. Vai para a cirurgia e volta, vai para a radioterapia e volta. O enfermeiro que o recebe aqui à primeira, normalmente, é quem o acompanha até ao fim do processo».

Estes enfermeiros e enfermeiras acabam por ser o «ponto de referência» para o doente, que assim não se sente perdido. «Porque depois a radioterapia é com um médico, a cirurgia é com outro e assim por diante. Mas o enfermeiro que apanha o doente aqui, desde o princípio, é sempre o mesmo».

A enfermeira Daniela Costa, no hospital de Portimão, acrescenta que, quando o doente ali chega, «já vem com muitos medos e muitos receios, já pesquisou no Dr. Google, vem com ideias pré feitas e esta consulta e enfermagem explica todo o processo que lhe vai acontecer a partir daquele momento e esclarece todas as dúvidas e receios com que ele chegou a esta consulta». E essa explicação é dada «tanto a ele, como aos familiares que o acompanham». E continua disponível ao longo de todo o processo.

No fundo, salienta, «somos o rosto», que humaniza um processo sempre assustador.

O médico Edgar Amorim acrescenta que a equipa de enfermagem «tem aqui outro papel importante que é o de, para além da avaliação social da pessoa, saber o que se pode esperar da família».

A equipa de enfermagem que integra o Centro de Referência é coordenada pelo enfermeiro Ricardo Mestre, que faz parte da «equipa nuclear». «Temos participado sempre naquilo que nos é solicitado e contribuído para que as coisas funcionem dentro do que está preconizado, de forma a prestar cuidados mais ajustados às necessidades dos nossos doentes», garante.

O médico radiologista Jorge de Brito – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

Outro elemento importante na equipa do Centro de Referência é o nutricionista. «Estes doentes, muitas vezes, chegam-nos com défices nutricionais e são encaminhados logo para a consulta de nutrição no próprio dia, se for necessário. São doentes com défices vitamínicos ou anemias crónicas», explica Edgar Amorim.

Elemento chave do Centro de Referência é igualmente a Radiologia, fundamental para o diagnóstico e para o estadiamento, por TAC ou Ressonância Magnética. «A Radiologia é um serviço fundamental, porque um estadiamento que não seja o mais preciso possível poderá levar a decisões que não são as mais adequadas».

O médico especialista Jorge de Brito, da unidade de Faro, é o responsável por esse trabalho no Centro de Referência. «A minha área de subespecialização é a radiologia abdominal», explicou ao Sul Informação, o que significa que, «no Centro de Referência, os exames que são feitos aos doentes com cancro do reto não são feitos por um radiologista qualquer».

A «janela temporal» em que os exames são feitos é «fundamental». Não há, aliás, lista de espera para os doentes do cancro do reto. «O grande problema é que o serviço de Radiologia não dá resposta apenas ao Centro de Referência. Isso exige uma organização para que nós consigamos dar uma resposta positiva, quer em termos de tempo, reduzindo ao máximo os tempos de espera dos doentes, quer em termos de qualidade, lá está, porque estes exames não podem ser feitos por qualquer pessoa».

Jesus Cadillá, diretor da Anatomia Patológica do CHUA – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

A Anatomia Patológica, instalada em Faro, é outro serviço fundamental. O seu responsável é o médico especialista Jesus Cadillá, que, segundo o coordenador Edgar Amorim, chefia um serviço que funciona «quase como os nossos polícias».

Nesta equipa multidisciplinar há igualmente a Oncologia. Nem poderia ser de outra forma já que é de cancro que se fala. A reportagem do Sul Informação foi encontrar o médico especialista Pedro Santos no hospital de dia da Oncologia, na unidade hospitalar de Portimão.

Em relação ao cancro do reto, o oncologista Pedro Santos garante que, «ao contrário do que muita gente pensa, a componente genética é relativamente pequena em relação a este tipo de neoplasias». O que explica o aparecimento desta doença é a «predominância dos maus hábitos alimentares», já que «açúcar é terrível, as carnes vermelhas também», mas igualmente o «sedentarismo, a obesidade».

Por isso, defende, «devemos apostar sempre no rastreio e na avaliação precoce. Porque há uma diferença entre conseguir curar uma doença agressiva, mas ainda numa fase mais precoce, ou uma doença não curável».

«Isto é uma boa aposta do Dr. Edgar, que é o mentor do Centro de Referência. É um centro altamente especializado e diferenciado, que permite tratar corretamente os doentes. Acho que o Algarve merece e tem uma boa equipa cirúrgica, tem uma boa equipa de oncologia. Esta parceria entre todos vem ajudar nesse aspeto», salientou, a terminar, Pedro Santos.

O oncologista Pedro Santos, no hospital de dia de Oncologia, em Portimão – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

Trabalhar com uma equipa multidisciplinar faz toda a diferença. É que, graças a esta abordagem, a cada doente não é aplicado um «tratamento standard» igual para todos, frisa o coordenador Edgar Amorim. Antes pelo contrário.

«Apesar de hoje em dia nós termos muita tecnologia e de termos acesso a drogas diferentes que não tínhamos há uns anos, para mim a grande evolução no tratamento da doença oncológica é a avaliação multidisciplinar, centrada naquele doente específico e que tem em conta a qualidade da sua vida futura. Aquela imagem que muitas vezes tínhamos, de que o doente fazia um tratamento standarizado, isso hoje em dia já não existe. Costumamos dizer “o cancro que o vizinho tem é um cancro diferente do que o que este doente tem”. Há agora uma decisão personalizada, multidisciplinar e que tem em conta a qualidade de vida futura do doente. Ou seja, avaliamos o individuo com a doença e não apenas a doença em si». 

Uma das situações que Edgar Amorim considera que é preciso «desmistificar» é que nem sempre «depressa é bem», nem mesmo num cancro. «O ir depressa, às vezes, não é importante. É importante ir bem. Estadiar é perceber exatamente toda a envolvência do tumor e depois, a partir daí, tomar as melhores decisões de tratamento, pela equipa, pelos vários profissionais. Porque depois isto envolve sempre um tratamento longo e quase sempre envolve um tratamento prévio de quimio e radioterapia. Esta é uma das grandes mudanças dos últimos 20 anos: não se opera logo, primeiro faz-se quimioterapia ou radioterapia, que demora várias semanas, e depois, se ainda for necessário, a cirurgia».

O médico especialista Pedro Santos já tinha explica isso mesmo: «a oncologia, juntamente com a radioncologia, têm um papel muito importante nestes tipos de tratamentos», porque conseguem atuar «em tumores que à partida podem não ter indicação para cirurgia ou cuja cirurgia pode ser muito difícil». «A quimioterapia e a radioterapia, quando aplicadas antes da cirurgia, conseguem regredir ou reduzir o tamanho do tumor, de modo a poder fazer cirurgias que, à partida, não eram possíveis. E, em alguns casos, até conseguem eliminar por completo o tumor», sem que seja necessário recorrer à cirurgia.

José Brás, Edgar Amorim e Paulo Caldeira – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

A reportagem vai muito longa, mas falta ainda abordar um tema que assusta muita gente, quando se fala de cancro que afete os intestinos, seja do cólon, seja do reto: a colostomia, ou seja, o saco para onde saem as fezes.

«As colostomias definitivas são cada vez menos frequentes. Há novas técnicas», garante o enfermeiro José Brás.

«Até nisso, as coisas têm evoluído muito. Se, há uns anos, havia uma grande probabilidade de os doentes ficarem com a colostomia para toda a vida, hoje em dia estas indicações começam a ser cada vez mais reduzidas», acrescenta.

Mas é um facto que muitos doentes irão depender do saco de colostomia. Porém, além de, neste momento, os dispositivos serem muito mais fáceis de usar e de substituir, esse aspeto não é esquecido pelo Centro de Referência. «Há consultas próprias, tanto em Faro como em Portimão, onde são acompanhadas as pessoas já na fase final do seu tratamento ou que vão viver toda a vida» com o saco de colostomia.

«Essa preocupação assusta-nos, quando não conhecemos, quando há muitos mitos, daí ser necessário esclarecer. Recordo uma jovem que tem um desses sacos por onde saem as fezes e que, depois da sua cirurgia e depois de ter sido colocado o saco, decidiu, em conjunto com o marido, engravidar e ter o seu filho. Ou seja, quando se pensa “ai vamos ter um saco e vai ser terrível”, é de facto um problema naquele instante, mas vamos viver com aquela questão e fazer com que deixe de ser um problema, para passar a ser uma situação de vida», diz ainda José Brás. A equipa de enfermagem que acompanha, de forma próxima, cada doente que entra no Centro de Referência é, mais uma vez, «fundamental».

O cirurgião Edgar Amorim corrobora: «hoje em dia, ter uma colostomia não significa obrigatoriamente que a pessoa não tenha qualidade de vida. Há pessoas com colostomias que fazem maratonas. Há pessoas com colostomias que fazem a sua vida normal, que engravidam, podem nadar. Daí, também, a importância de termos, no Centro de Referência, equipas preparadas para lidar com estas situações».

Todos os doentes com cancro do reto são discutidos semanalmente pela equipa nuclear numa reunião multidisciplinar de grupo. Isso «permite garantir que os nossos doentes tenham uma opção terapêutica validada de acordo com as melhores práticas. Atualmente, as opções terapêuticas no nosso centro diferem apenas pontualmente das ofertas que podem ser oferecidas por outros centros nacionais ou internacionais. Esta é seguramente uma mais-valia para a nossa população, saber que na sua área de residência consegue aceder aos melhores tratamentos disponíveis na atualidade», sublinha o coordenador do único Centro de Referência no Algarve e Baixo Alentejo. De resto, diz ainda, o cancro do reto, «em termos do tubo digestivo, é o mais frequente, mas também é o mais tratável».

Para mais porque, como faz questão de frisar, no CHUA, tanto na unidade de Faro, como na de Portimão, «não há limites de vagas para os cancros de reto. Ou seja, o número limite nas primeiras consultas dessa semana é o número de pedidos que nos chega. De acordo com os últimos dados oficiais e publicados, tivemos um tempo de resposta de aproximadamente 9 dias, o que coloca o nosso centro bastante abaixo dos tempos definidos por lei e demonstra a capacidade que o Centro de Referência tem de responder a estas solicitações. Não há tempo de espera, nem lista». E só isso já é uma boa notícia.

Reunião semanal, com ligação online aos colegas de Portimão – Foto: Elisabete Rodrigues | Sul Informação

Situação do cancro colorrectal em Portugal e no Algarve

O cancro colorrectal tornou-se num importante indicador de saúde publica internacional, sendo os seus resultados e políticas instituídas alvo de acompanhamento por diferentes organizações nacionais e internacionais.

Os dados de 2020 conhecidos revelam que, em Portugal, existiram 10500 novos casos de cancro colorrectal, correspondendo a cerca de 17% de todos os novos cancros diagnosticados. O cancro colorrectal, quando avaliados em conjunto os dois sexos, ocupa a 1º posição do ranking de novos caso por ano. Isoladamente, o cancro do reto foi responsável por cerca de 8,2 % dos novos casos, aproximadamente cerca de 5000 casos.

Das 30.118 mortes ocorridas em 2020 em Portugal por cancro, 4320 (14,3 %) ocorreram por este tipo de cancro o que o coloca como 2º causa de morte por cancro.

Contudo, nem tudo são más notícias, uma vez que a taxa de mortalidade tem vindo gradualmente a diminuir. A título de exemplo, no Algarve, os dados oficiais de 2018 e comparativamente a 2015 revelam uma diminuição de óbitos por cancro do cólon de cerca de 34% e de cerca de 10% no cancro do reto.

O cancro do reto, até meados dos anos 80, apresentava uma sobrevivência após os 5 anos de diagnóstico de cerca de 27 a 42%, que contrasta com os 70 a 80% atuais. A taxa de recorrência passou igualmente no mesmo período de 30% para 8%.

Para que isto seja possível, muito tem contribuído o elevado esforço que as instituições de saúde e, em especial a unidade do CHUA, tem desenvolvido na criação de equipas altamente diferenciadas e na implementação de programas de rastreio.

O que é o cancro colorrectal e como surge?

O tubo digestivo é formado pelo conjunto de estruturas anatómicas que vão da boca até ao ânus. É ao longo do tubo digestivo que os alimentos se deslocam e sofrem transformações através de um processo denominado por digestão, de modo a poderem ser absorvidos. O cólon (intestino grosso) e o reto estão localizados na parte terminal do tubo digestivo

O cancro colorrectal desenvolve-se devido à produção descontrolada das suas células do revestimento interno. Este processo é geralmente lento e pode demorar vários anos até existirem sintomas que possam alertar para o seu aparecimento.

Inicialmente, esta produção descontrolada dá origem a tumores benignos, conhecidos como pólipos, que, quando não são tratados, podem adquirir características diferentes e transformarem-se em tumores malignos (Cancro).

Em 85 % dos casos, não existe nenhuma relação genética ou familiar com o aparecimento do cancro. Por outro lado, é conhecida a sua associação com determinados hábitos alimentares, em especial ao consumo de carnes vermelhas e de gordura de origem animal, com o estilo de vida sedentário e o consumo de álcool e de tabaco.

Foto: DR

Quais os sintomas / sinais de alarme?

Apesar de não existir uma sintomatologia que seja exclusiva do cancro colorrectal, existem alguns sinais que devem fazer soar o alarme e levar a uma avaliação nos cuidados de saúde primários, principalmente para quem tiver mais de 50 anos. Convém lembrar que 90% dos novos casos acontece acima dos 50 anos de idade.

Estes sinais de alarme, quando não procurados, podem passar despercebidos. Incluem a existência de alteração do trânsito intestinal e das suas características, a existência de sangue nas fezes, emagrecimento sem motivo aparente, anemia.

Importância do Rastreio (doentes sem sintomatologia)

Em Portugal e de acordo com o plano nacional de prevenção e controlo das doenças oncológicas, o rastreio do cancro do cólon e do reto nos indivíduos assintomáticos, ou seja, sem qualquer sintomatologia, deve ser realizado entre os 50 e os 75 anos.

O método preconizado consiste na pesquisa de sangue oculto nas fezes, um teste não invasivo. Caso seja positivo, é orientado posteriormente para a realização de uma colonoscopia.

O rastreio regular pode prevenir a doença, uma vez que o cancro do colon e do reto têm um crescimento lento desde o aparecimento da lesão precursora até à sua transformação em cancro.

A redução da mortalidade e o aumento da sobrevivência está diretamente relacionada com a fase da doença (estadio) em que esta se apresenta. Deste modo, quanto mais precoce o diagnóstico, maior a probabilidade de ultrapassarem com sucesso esta fase da vida.

Fotos: Elisabete Rodrigues | Sul Informação (à exceção das imagens da cirurgia)

in Sul Informação